
Empresas que atuam com locação de bens móveis, licenciamento de ativos digitais, arrendamento operacional, cessão de direitos e diversos serviços atípicos precisam estar atentas: o novo sistema tributário de base ampla trará impacto direto em preços, contratos e margens de negócios.
A aprovação do novo sistema tributário brasileiro, estruturado a partir do IVA dual (IBS + CBS), representa uma mudança profunda não apenas para as operações tradicionais de vendas de bens e serviços, mas também para atividades que, até hoje, escapavam da incidência tributária de forma legítima.
No sistema atual, a tributação sobre o consumo é altamente fragmentada: o ICMS incide apenas sobre a circulação de mercadorias, enquanto o ISS se limita a uma lista específica de serviços prevista na Lei Complementar nº 116/2003. Essa configuração permitiu que muitas operações legítimas fossem realizadas sem a incidência de tributos sobre consumo.
Com o novo modelo, essa lógica muda radicalmente. O IBS (estadual e municipal) e a CBS (federal) incidirão sobre qualquer fornecimento oneroso de bens e serviços, salvo exceções muito restritas previstas em lei.
Em outras palavras, o conceito de ‘serviço’ e ‘mercadoria’ se amplia para abranger praticamente toda atividade econômica que gere receita. As empresas que lidam com as operações abaixo devem ficar atentas:
(i) Locação de equipamentos, máquinas, veículos e bens móveis em geral;
(ii) Licenciamento de softwares para consumidor final, cessão de plataformas digitais e disponibilização de conteúdos online;
(iii) Cessão de direitos de uso de bens ou ativos intangíveis (como direito de superfície, direito de exploração econômica);
(iv) Serviços de intermediação atípica, consultorias fora da lista tradicional de ISS;
(v) Serviços de publicidade digital, anúncios em plataformas, marketing de influência;
passarão a ser tributadas com alíquotas combinadas de CBS e IBS.
As empresas que atuam nesses setores devem se preparar para enfrentar não apenas o impacto financeiro imediato da nova tributação, mas também uma reestruturação profunda nos seus modelos de negócios.
Isso necessariamente vai obrigar as empresas a lidarem com (i) revisão de preços: a necessidade de incorporar o imposto destacado ao valor cobrado exigirá reajustes contratuais e renegociação com clientes e fornecedores; (ii) Redesenho de contratos: cláusulas de preço, reajuste e repasse de tributos deverão ser revistas para contemplar a incidência do IVA; (iii) Adequação de sistemas fiscais e de faturamento: será necessário adaptar sistemas internos para emissão correta de documentos fiscais eletrônicos, apuração de créditos e débitos e escrituração;
(iv) Avaliação de margens de rentabilidade: setores hoje mais competitivos em razão da ausência de carga tributária precisarão revisar suas projeções financeiras;
(v) Planejamento estratégico: novas estruturas contratuais e societárias podem ser necessárias para otimizar a carga tributária no novo ambiente.
Empresas que tradicionalmente exploravam a locação de ativos, cessão de direitos ou licenciamento de produtos digitais a consumidores finais precisam agir desde já. A transição, ainda que gradual, será inexorável. Por isso, mais do que um tema de departamento tributário, a tributação das operações atualmente não oneradas impacta diretamente a competitividade, formação de preços e relacionamento com clientes. Empresas que não se anteciparem correm o risco de sofrer erosão abruta de margens, litígios contratuais e perda de posição de mercado.
A reforma tributária trouxe ganhos evidentes de simplificação e segurança jurídica, mas também retira proteções informais que beneficiavam setores específicos. Em mercados competitivos como esses listados acima, a capacidade de adaptação rápida fará a diferença.
O momento é de mapear operações que serão impactadas, recalcular preços, renegociar contratos e reposicionar estrategicamente a atuação. No novo cenário, toda operação onerosa será a regra – e a não tributação, a exceção.
Luiz Roberto Peroba é Sócio/Tax Partner no Pinheiro Neto. Assessora clientes nacionais e estrangeiros de diversas indústrias, tanto em consultoria/planejamento tributário como contencioso, em disputas administrativas e judiciais.
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