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Reforma tributária: o que muda para o setor elétrico?

Linhas de transmissão de energia – Foto: Matthew Henry via Unsplash

Por Leonardo A. B. Battilana

Com mais uma etapa da Reforma Tributária concluída (publicação da Lei Complementar nº 214/2025), as empresas começam a ter mais clareza sobre as regras e o que poderá impactar nas suas atividades do dia a dia. Logicamente, ainda há importantes normas a serem editadas para que os contribuintes efetivamente tenham condições de implementar sistemas e se prepararem para o momento de transição.

O objetivo do presente artigo é avaliar as mudanças da LC nº 214/2025 para as empresas do setor elétrico. Especificamente sobre as operações com energia elétrica, a legislação alguns importantes dispositivos.

Em primeiro lugar, o artigo 3º estabelece que todas as energias, com valor econômico, sejam equiparadas a bens materiais. Esse conceito foi adotado para que as energias sejam alcançadas pelo fato gerador do IBS e da CBS (fornecimento nas operações com bens ou serviços).

O artigo 10º trata sobre o fato gerador do IBS e da CBS. Há uma hipótese de exceção para as operações de energia elétrica. O § 3º do artigo 10º, determina que nos casos de operações de execução continuada ou fracionada, em que não seja possível identificar o momento da entrega ou disponibilização do bem (ou ainda o término do fornecimento do serviço), o fato gerador será considerado no momento do pagamento.

O artigo 11, por sua vez, dispõe sobre o local da operação. Como regra geral, o local da operação deve ser considerado o local da entrega ou disponibilização do bem ao destinatário (local do consumo). O mesmo racional foi adotado para as operações com energia elétrica, com aplicação de particularidades ao setor.

O legislador estabelece que o local será no destino da entrega ou disponibilização (§ 7º do artigo 11), quando destinada para consumo ou no local do estabelecimento principal do adquirente, no fornecimento de serviços de transmissão, geração, distribuição ou comercialização de energia (que não seja para consumo).

A LC também traz a regra do local para operações relativas às liquidações financeiras de contratos no Mercado de Curso Prazo (MCP) e firmados no Ambiente de Comercialização Livre (ACL). Nesses casos, nas aquisições de energia elétrica, realizadas de forma multilateral, o local da operação é o domicílio do agente que figure como devedor no balanço energético. 

O artigo 28, trata da extinção dos débitos (pelo pagamento) e reforça os conceitos que foram trazidos pelo artigo 11. A mecânica de recolhimento de IBS e da CBS ocorrerá da seguinte forma:

• Pela Distribuidora: nas operações de venda para consumidores do Ambiente de Contratação Regulada (ACR).

• Pelo Alienante de energia: nas operações realizadas no ACL destinadas para consumo ou quando o adquirente não for contribuinte do IBS e da CBS.

• Pelo Adquirente de energia: na aquisição para consumo por agente devedor no MCP.

• Pela Transmissora: na prestação de serviço de transmissão de energia elétrica a consumidor conectado à Rede Básica de Transmissão.

O artigo estabelece, ainda, que o recolhimento do IBS e da CBS, sobre operações com energia (ou direitos a ela relacionados) relativas à geração, comercialização, distribuição e transmissão somente ocorrerá no fornecimento para: consumo; ou contribuinte não sujeito ao regime regular de IBS e CBS.

Note-se que todas essas regras buscaram deixar uma redação semelhante ao que se vê hoje na tributação pelo ICMS. Atualmente, a tributação do ICMS é diferida e ocorre apenas no consumo da energia elétrica. A regra do MCP também é a mesma que existe para o ICMS hoje. Portanto, para IBS não haverá uma grande mudança.

A maior mudança fica para o PIS e COFINS, pois, atualmente, a tributação ocorre no faturamento (sem diferimento) e, com a Reforma Tributária, a CBS (que substituirá essas contribuições) também será diferida para pagamento apenas no consumo ou para remessa a pessoa não contribuinte.

Outro ponto que está semelhante à regra atual é a tributação nas operações de Geração Distribuída (GD). Hoje há uma isenção de ICMS e alíquota zero de PIS/COIFINS para uma determinada faixa de potência e algumas modalidades específicas. A LC nº 214/2025 autorizou a exclusão, da base de cálculo do IBS e da CBS, a energia elétrica compensada no sistema da GD, o que, na prática, não muda muito a regra de hoje.

Além disso, LC nº 214/2025, respeitando a diretriz constitucional (trazida pela Emenda Constitucional 132/2023) traz previsão expressa de que não haverá incidência do Imposto Seletivo sobre as operações com energia elétrica (artigo 413, inciso II). Essa era uma das maiores preocupações do setor, principalmente após a vitória do Tema 745, julgado pelo Supremo Tribunal Federal.

Ainda há outros importantes pontos para o setor, como, por exemplo, discussões relacionadas a perdas técnicas, mudança nos benefícios para implantação/construção de ativos de energia elétrica, impactos na autoprodução de energia e nas operações com energia renovável (em geral), mudança nos benefícios fiscais aos consumidores de baixa renda, dentre outros.

Por fim, ainda que o período de transição seja o mais desafiador para os contribuintes, na nossa visão, a LC nº 214/2025 buscou não alterar muito o padrão de tributação sobre o consumo, atualmente existentes para o setor elétrico. De qualquer forma, ainda que tenha sido estabelecida uma base de tributação do setor elétrico, há alguns pontos a serem trabalhados nos atos normativos ainda pendentes de edição pelo governo federal.


Leonardo A. B. Battilana, sócio da área tributária do Veirano Advogados. LL.M pela Northestern Pritzker School of Law. Pós-graduado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV-SP) e graduado pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP)


Os artigos escritos pelos “colunistas” não refletem necessariamente a opinião do Portal da Reforma Tributária. Os textos visam promover o debate sobre temas relevantes para o país.

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