Pular para o conteúdo

Reforma Tributária: o futuro das regulamentações diante dos princípios basilares

Reprodução: Freepik.

Por Andréa Pucci

Quando a Reforma Tributária começou a ser debatida pelo mercado, o que mais se escutava nas rodas de discussões generalistas era que se tratava apenas de mais uma atualização legal, ou apenas mais uma das centenas de alterações da legislação tributária, como as que ocorrem diária e ininterruptamente.

No entanto, agora está cada vez mais claro para todos o que se percebia há tempos no mundo tributário/fiscal; o fato de que se trata de uma mudança complexa do sistema tributário brasileiro, que vai impactar a população e os negócios de maneira ampla e geral.

Isso porque, após um longo período de tramitação no Congresso e diversas discussões e modificações, em janeiro deste ano foi finalmente sancionada pelo presidente da república a Lei Complementar nº 214, que institui o IBS (Imposto sobre Bens e Serviços), a CBS (Contribuição Social sobre Bens e Serviços) e o IS (Imposto Seletivo), além de criar o Comitê Gestor do IBS e promover alterações na legislação tributária brasileira, adicionando um novo capítulo nessa história.

Entretanto, para entender de que forma será necessário navegar em meio a tantas mudanças na prática, e quais os impactos dessas alterações no nosso dia a dia, comecemos do princípio. 

A Constituição Federal determina os seguintes Princípios Tributários: legalidade, isonomia, capacidade contributiva, irretroatividade da lei tributária, anterioridade e não-confisco. Estes princípios basilares já estão muito bem consolidados e não sofrerão alterações entre si, mesmo diante de tantas mudanças. 

Porém, no que se refere à Reforma Tributária, dois deles se destacam: o da legalidade e o da anterioridade. Portanto, apesar de já termos a previsão de uma alíquota referência, todas as alíquotas ainda serão definidas pelos entes competentes, estados e municípios, que para tanto devem respeitar, a anterioridade anual, a nonagesimal, bem como a legalidade.

A Reforma Tributária tem princípios próprios, que são: simplicidade, transparência, neutralidade, cooperação, defesa do meio ambiente e regressividade.

Apesar da simplicidade ser o princípio guia de toda essa mudança, tanto no que tange à redução do número de tributos quanto à redução de documentos fiscais e uma maior clareza da legislação, há uma complexidade inerente em todo o processo, principalmente em se tratando da legislação tributária brasileira, internacionalmente conhecida como uma das mais complexas do mundo.

A subjetividade, o volume e a quantidade de alterações na legislação atual implicam também numa dificuldade ímpar para aplicar o novo cenário.

Embora se espere uma alíquota padrão para as operações com bens e serviços, como ocorre em outros países que adotaram o IVA (Imposto sobre Valor Agregado), a realidade sempre é diferente no Brasil, um pouco justificável pela sua dimensão continental. 

O IVA brasileiro é composto por três alíquotas: a União definirá a da CBS, enquanto Estados e municípios determinarão as do IBSUF e IBSMun, respectivamente. 

Isso pode frustrar o objetivo de simplificação tributária proposta pelo governo, já que a ideia era substituir a multiplicidade de alíquotas atuais, determinadas geralmente por produtos/serviços, por uma única, imitando o cenário tributário de outros países com o IVA, que pelo que estamos percebendo, só será substituído por uma variedade de alíquotas de acordo com a localidade do destinatário.

Segundo estudo publicado pelo Ministério da Fazenda, a expectativa é que haja um aumento médio de 1,47 ponto percentual na alíquota de referência do Imposto sobre Valor Agregado (IVA), passando dos estimados 26,5% para 28%. Caso a previsão se confirme, ela posicionará o Brasil como detentor da maior taxa de IVA do mundo, ultrapassando o IVA padrão de 27% da Hungria, atual líder do ranking global.

Há ainda a complexidade da transição na prática. Segundo o cronograma estabelecido, 2026 será considerado o período de teste da CBS, com aplicação da alíquota de 0,9%, que entrará plenamente em vigor a partir de 2027, quando substituirá de vez as contribuições do PIS e da Cofins.

Quanto ao IBS, teremos, em relação aos fatos geradores ocorridos de 1º de janeiro de 2027 a 31 de dezembro de 2028, a alíquota estadual de 0,05% (cinco centésimos por cento) e o mesmo percentual para o IBSMun. 

Também em 2027, as alíquotas do IPI serão reduzidas a zero, exceto para os produtos produzidos na Zona Franca de Manaus. Entre 2029 e 2032, as alíquotas do ICMS e do ISS serão reduzidas gradualmente em 10%, 20%, 30% e 40%, enquanto as alíquotas do IBS serão aplicadas proporcionalmente, com a plena implementação do imposto em 2033.

Apesar de ser gradual, a transição para o novo sistema tributário promete ser complexa, sobretudo devido ao paralelismo tributário, período em que as organizações deverão conviver com as novas determinações, sem deixar de cumprir com as obrigações atuais.

Portanto, as empresas têm um curto período de tempo para se preparar, considerando a complexidade e o investimento que uma mudança desse porte acarretará às diversas áreas.

Como o impacto real na precificação depende da forma como as alíquotas ficarão definidas, das transições entre os tributos atuais e os novos e de possíveis compensações e benefícios fiscais, uma das maneiras das empresas, de fato, já se prepararem para o futuro é por meio de análises preditivas e simulação de cenários.

Com foco nessa complexidade, o mercado tem desenvolvido simuladores que avaliam automaticamente os efeitos da Reforma Tributária, comparando a tributação vigente com a prevista na nova legislação para as operações empresariais. Essas soluções são completas e possibilitam a criação de regras, além de atualizar as alterações anunciadas pelo governo em tempo real. 

Dessa forma, é possível antecipar e apresentar os impactos financeiros nas transações das empresas não só no período de transição entre os dois regimes tributários, como durante a implementação integral da Reforma a partir de 2033.


Andréa Pucci é advogada tributarista e consultora de conteúdo tributário da Sovos Brasil.


Os artigos escritos pelos “colunistas” não refletem necessariamente a opinião do Portal da Reforma Tributária. Os textos visam promover o debate sobre temas relevantes para o país.