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Impacto da reforma tributária sobre o consumo no processo de precificação

Dividendo dinheiro
Reprodução: Freepik.

Por Márcio Robson Costa

O sistema tributário brasileiro é reconhecidamente complexo e fragmentado, com mais de 90 (noventa) tributos diferentes e uma carga tributária que corresponde a aproximadamente 33% do PIB. Essa complexidade gera distorções na formação de preços, onera as empresas e dificulta a compreensão do consumidor sobre o real peso dos tributos embutidos nos produtos e serviços que adquire.

A reforma tributária sobre o consumo, atualmente em discussão no Brasil, representa uma das mais profundas mudanças na estrutura de tributação do país. A proposta busca substituir tributos como ICMS, ISS, PIS e COFINS pelo Imposto sobre Valor Agregado – (IVA), denominado IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) e a CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços). Essa reestruturação impactará diretamente a precificação de bens e serviços, alterando margens de lucro, competitividade e a carga tributária de diferentes setores da economia. 

Importante ressaltar, que quando se fala em precificação nos dias atuais, a reflexão perpassa no entendimento que todo e qualquer tributo indireto é embutido ou indissociável do preço e, quando isso acontece, o que o “consumidor final” paga é o preço devido pelo produto/serviço, considerando todos os custos inerentes à sua produção e a margem de lucro. Portanto, vale o que foi pactuado, sem consideração aos fatores que levaram a estipulação do preço, como o próprio tributo embutido.

Infere-se que o preço de venda de um bem ou serviço, primeiramente, deverá ser capaz de cobrir todos os custos e despesas, inclusive aqueles que parecem “invisíveis”, tais como taxas de entrega, armazenamento, taxas e impostos, inclusive anuais, entre outros. Como também, deverá ser capaz de fornecer lucro para a empresa, que, na prática, é o valor que sobra da venda do bem ou serviço após serem deduzidos os custos/despesas da mercadoria vendida, do trabalho, despesas fixas e variáveis e outras operacionais e administrativas.

O objetivo deste artigo é analisar alguns sensíveis impactos e efeitos dessa reforma na formação e percepção de preço, considerando os princípios constitucionais de isonomia e justiça fiscal, refletindo sobre como tais mudanças podem afetar as empresas no longo prazo, sobretudo, os consumidores, na perspectiva de que com a reforma a tributação indireta de sua renda consumida, se dê de forma clara, de modo que, ao consumir, toda a sociedade brasileira consiga saber exatamente quanto do montante gasto se refere ao preço do serviço/mercadoria e quanto se refere à sua obrigação de arcar com os tributos incidentes naquele consumo, o que hoje é cômodo pagar o tributo sem perceber que está sendo tributado (na forma indireta e disfarçada de preço)!

Para tanto, serão abordados temas como a transição do modelo de tributação “por dentro” para “por fora”, a eliminação da cumulatividade, os impactos setoriais, as estratégias de precificação que as empresas deverão adotar para se adaptar ao novo cenário (holofotes lançados para as empresas optantes pelo Simples Nacional), dentre outros aspectos que se relacionam com a titularidade deste artigo, longe da pretensa intenção de esgotar o tema, o que é totalmente justificado pela complexidade de que essa reforma não mira apenas em algumas árvores, mas sim toda a floresta, todo um ecossistema de operações e formas negociais, portanto, irei trazer algumas pílulas para reflexão.

Seguindo a diante, os tributos exercem papel fundamental na formação do preço final de produtos e serviços. No modelo tradicional, tributos como ICMS, ISS, PIS e COFINS são repassados ao consumidor final, muitas vezes de forma oculta, aumentando significativamente o valor pago pelo cliente, haja vista a tese bilionária, que ficou conhecida como a “tese do século”, que até hoje alimenta outras tantas teses filhotes, referente a valores de tributos embutidos no preço de bens e serviços e que parece que a lição de casa não foi realizada, é o que demonstra o PLP 16/2025, que restabelecer a ordem para que o IBS e a CBS, não deva ser incluídos na base de cálculo do IPI, ISS e do ICMS, o que de certo ratificaria a distorção do sistema atual e geraria consequências amargas tão conhecidas pelos contribuintes.

Na pretensão de tributar a renda consumida, os mencionados tributos têm em comum o fato de incidirem de forma indireta – ou seja, são cobrados do industrial, do comerciante ou do prestador de serviços e, idealmente, repassados indiretamente ao destinatário ou tomador (SOUSA, Rubens Gomes de. Ideias gerais sobre Impostos de Consumo), embutidos no valor total do preço cobrado no negócio (Conforme assinala Brandão Machado: “Tributo aí é apenas o nome de uma parcela dentre outras tantas que compõem o preço, mas que não é paga pelo terceiro a título de tributo”.

Com a mudança para o modelo do IVA, onde a tributação ocorre de maneira mais transparente e por fora do preço, haverá maior clareza sobre a real carga tributária, permitindo aos consumidores avaliarem com mais precisão o impacto dos impostos na sua decisão de compra, assim primando pela eficiência e o equilíbrio entre a arrecadação e estímulo econômico, consequentemente promovendo um monitoramento da carga tributária no preço.

Impactos da Tributação por Dentro e por Fora

Uma das mudanças fundamentais com a reforma é a adoção do modelo de tributação “por fora”, tornando a carga tributária mais transparente para o consumidor final. Atualmente, no modelo “por dentro”, o imposto está embutido no preço do produto ou serviço, dificultando a percepção do real peso da tributação.

Com a mudança para a tributação “por fora”, o valor do tributo será explicitamente discriminado na nota fiscal, facilitando a compreensão do consumidor e promovendo maior transparência fiscal. No entanto, essa alteração pode impactar a precificação, consequentemente a percepção de preços, pois produtos e serviços que anteriormente tinham valores aparentemente mais baixos podem ser vistos como mais caros quando o imposto for explicitamente destacado. Esse efeito pode influenciar a demanda e exigir ajustes nas estratégias comerciais. Evidentemente que a recíproca é verdadeira, no que tange a percepção do quantum se paga de tributos nas operações.

Além disso, a tributação por fora pode criar desafios para setores que dependem da precificação psicológica, onde os preços são arredondados para números mais atraentes ao consumidor. Empresas precisarão avaliar como essa mudança afetará a competitividade de seus produtos e serviços no mercado.

Abrindo um parêntese, conceitualmente a precificação psicológica é uma estratégia de definição de preços baseada no comportamento do consumidor e na percepção de valor de um produto ou serviço. Esse conceito reconhece que os consumidores nem sempre tomam decisões racionais ao avaliar preços, sendo influenciados por fatores subjetivos, como a forma como o preço é apresentado.

A tributação “por fora” não altera o custo real para o consumidor final (que já pagava os tributos embutidos), mas muda a percepção psicológica do preço, impactando decisões de compra. Empresas precisarão reavaliar estratégias de marketing, comunicação e precificação para evitar perda de competitividade.

Essa estratégia reforça a ideia de que a forma como o preço é apresentado impacta diretamente a decisão do consumidor. No contexto da tributação por fora, essa percepção pode ser alterada negativamente, já que o valor total pago se torna mais evidente e pode parecer mais alto do que quando o imposto está embutido no preço. Essa estratégia pode enfrentar desafios significativos. Quando o imposto é embutido no preço (tributação por dentro), o consumidor percebe um valor total sem distinção da carga tributária. No entanto, com a tributação por fora, o imposto aparece discriminado separadamente, tornando o valor final mais alto do que o inicialmente anunciado, o que pode impactar negativamente a decisão de compra.

Setores que dependem fortemente desse tipo de estratégia, como varejo, serviços de assinaturas e alimentação, podem sofrer impactos diretos, pois a exposição do imposto pode reduzir a atratividade do preço aos olhos do consumidor. Isso pode forçar empresas a revisarem suas abordagens de precificação e comunicação de valores ao público.

Importante ressaltar que no período de transição, entre 2026 e 2033, a coexistência de tributos “por dentro” e “por fora”, irá exigir uma gestão fiscal minuciosa de precificação, sobretudo no que tange a renegociação de preços de compras, o que de certo envolve o trabalho de revisitar contratos com fornecedores, afim de garantir a saúde financeira das empresas.

Eliminação da Cumulatividade e Redução de Distorções

Um dos principais problemas do sistema tributário atual é a cumulatividade dos tributos indiretos, que gera distorções na precificação, especialmente em cadeias produtivas longas. Com a implementação do IVA, espera-se uma redução dessa cumulatividade, permitindo uma formação de preços mais transparente e alinhada com os custos reais. Essa mudança visa atender ao princípio da isonomia tributária, garantindo uma tributação mais equitativa. O novo modelo também trará maior previsibilidade para empresas, permitindo um planejamento financeiro mais eficiente, diminuindo os custos com burocracia fiscal.

A não cumulatividade, assim, deve ser neutra na formação do preço, afim de não proporcionar a verticalização das empresas, buscando garantir competitividade aos produtos nacionais e afastar os efeitos nefastos da cumulação de tributos plurifásicos na circulação econômica.

A eliminação da cumulatividade trará benefícios para setores como a indústria, que atualmente sofrem com a sobreposição de tributos ao longo da cadeia produtiva. No entanto, setores como o de serviços, que hoje se enquadram em regimes com uma carga tributária mais branda, podem enfrentar um aumento da carga tributária, o que pode resultar em preços mais elevados.

Contudo, imperioso e necessário manter um olhar crítico sobre a efetividade desse princípio, já que em modelos baseados em um IVA 4.0, os chamados resíduos tributários na cadeia, isto é, tributos que não são recuperáveis ao longo do processo produtivo, não serão mais um risco.

Por fim, cabe uma provocação neste tópico: se a reforma tributária prima por um sistema menos regressivo, eliminando resíduos na cadeia produtiva, será que o consumidor, irá perceber de fato, um alívio nos preços de bens e serviços, ou essa reforma foi idealizada apenas para beneficiar os contribuintes de direito, agentes da cadeia produtiva, em outras palavras, os CNPJ’s e não os CPF’s? Sim, senhores e senhoras, não podemos olhar apenas para as empresas, afinal a reforma deve ser para todos, até porque estamos tratando da reforma da tributação sobre as relações de consumo.

Não restam dúvidas, que a ideia é que, ao eliminar a cascata de tributos, o custo total dos produtos diminua, gerando alívio para o consumidor final. Todavia, a teoria é clara, mas a prática depende de quatro fatores críticos:

a) Alíquotas Definidas na Regulamentação
  • Se a alíquota referencial for calibrada para manter a neutralidade fiscal (ou seja, não aumentar a carga tributária total), é possível que parte da redução de custos chegue ao consumidor.
  • Porém, se o governo definir alíquotas mais altas para compensar perdas de arrecadação de estados e municípios, os preços podem não cair (ou até subir em alguns setores).
b) Comportamento das Empresas
  • Empresas com poder de mercado (monopólios, oligopólios) podem não repassar a redução de custos, absorvendo os ganhos como lucro.
  • Setores competitivos (como varejo de alimentos) tendem a repassar mais rapidamente os benefícios.
c) Mecanismos de Compensação Social
  • A Reforma prevê o cashback (reembolso de tributos para famílias de baixa renda). Se bem implementado, isso reduziria a carga indireta sobre os mais pobres, mesmo que os preços não caiam significativamente.
  • Sem essa compensação, o IBS pode manter a regressividade (já que tributos sobre consumo pesam mais para quem ganha menos).
d) Transição e Inércia de Preços
  • Mudanças tributárias geram custos de adaptação (ex.: reajuste de sistemas, renegociação de contratos). No curto prazo, empresas podem repassar esses custos aos preços.
  • A experiência internacional mostra que, em alguns casos, a redução de impostos só é percebida após anos (ex.: Índia, com o GST implementado em 2017).
Compreende-se que a implementação de um IVA, seja idealizada pensando em beneficiar ambos, CNPJ’s e CPF’s, contudo entendo que há dimensões diferentes a serem observadas: 
Para CNPJ’s (empresas):
  • Redução da complexidade fiscal: Unificação de tributos, fim de guerras fiscais e créditos amplos de impostos.
  • Setores com cadeias longas (ex.: indústria automotiva) ganham mais, pois sofrem hoje com a cumulatividade. O que pode levar a ganhos de produtividade, entretanto a depender do contexto, não se pode afirmar que irá diminuir os gastos com compliance, mas sim em ganho de margem para investimentos em inovação.
Para CPF’s (consumidores):
  • Potencial redução de preços em setores com alta concorrência (alimentos, eletrônicos).
  • Menos desigualdade tributária: Tributação única sobre bens e serviços (em vez de múltiplas alíquotas estaduais) pode tornar o sistema menos regressivo.
  • Porém, em setores com pouca concorrência (ex.: planos de saúde, combustíveis), o alívio pode ser mínimo. 

A intenção da Reforma Tributária é estrutural: corrigir distorções históricas do sistema brasileiro, que hoje onera mais os pobres e as empresas produtivas. O potencial de alívio para o consumidor existe, mas não é automático. Imperioso que se pratique a educação fiscal no país, consumidores devem entender os impactos de uma reforma tributária, essencialmente quando direcionada a tributação sobre o consumo. Entender as mudanças eleva toda sociedade a ser vigilante e pressionar por transparência nos preços.

Avançamos para os próximos tópicos!

Impacto Setorial e Redistribuição de Carga Tributária

A alíquota uniforme do IVA pode gerar impactos distintos entre setores. Setores atualmente beneficiados por regimes mais aprazíveis, como o setor de serviços, podem enfrentar um aumento da carga tributária, o que pode resultar em preços mais elevados. Isso ocorre porque muitos serviços hoje pagam alíquotas reduzidas de PIS e COFINS (3,65%) e ISS, com percentuais inferiores à estimativa da nova alíquota do IVA. Além disso, como empresas de serviços possuem poucos insumos para gerar créditos tributários, podem acabar arcando com um custo maior em comparação ao modelo atual. Por outro lado, segmentos industriais podem experimentar redução de custos tributários, permitindo ajustes para baixo na precificação final. Isso demonstra que a reforma, embora simplificadora, trará impactos desiguais entre os setores da economia, o que muito se justifica pelo fatiamento da reforma tributária, a qual não se deu em conjunto com outras reformas possíveis, como por exemplo a reforma da folha de pagamento, o que poderia trazer uma dosimetria interessante para o setor de serviços. 

Impacto da Reforma Tributária no Preço para as Empresas Optantes do Simples Nacional

Incluir um tópico específico sobre o impacto da Reforma Tributária no preço para as empresas optantes do Simples Nacional é de suma relevância, já que essas empresas representam uma parcela significativa do mercado brasileiro e detém um regime tributário diferenciado.

O Simples Nacional é um regime tributário simplificado que beneficia micro e pequenas empresas, unificando o pagamento de tributos federais, estaduais e municipais em uma única guia. No entanto, a Reforma Tributária proposta pode trazer mudanças significativas para essas empresas, especialmente no que diz respeito à formação de preços e à competitividade no mercado.

Portanto, na precificação de produtos, mercadorias e serviços, é importante que o gestor das MPE’s esteja ciente de que o preço de venda deve ser capaz, primeiramente, de cobrir todos os custos e despesas, os cálculos não devem ocorrer por aproximação, baseado em pesquisas, mas sim em planilhas de custos, com projeções de cenários. 

O Simples Nacional foi criado para reduzir a carga tributária e a burocracia para micro e pequenas empresas. No entanto, a Reforma Tributária pode exigir ajustes significativos para garantir que esses benefícios sejam mantidos, especialmente em setores que dependem de regimes especiais de tributação.

As empresas optantes do Simples Nacional precisarão revisar suas estratégias de precificação para se adaptar à nova sistemática tributária. Com a adoção do IVA, a carga tributária pode aumentar para algumas empresas, especialmente aquelas que atuam em setores com alíquotas reduzidas no regime atual. Isso pode exigir ajustes nos preços dos produtos e serviços, impactando a competitividade no mercado.

Por outro lado, a eliminação da cumulatividade pode trazer benefícios para as empresas do Simples Nacional, especialmente aquelas que atuam em cadeias produtivas longas. A redução da sobreposição de tributos pode resultar em custos menores e preços mais competitivos. Um exercício que os profissionais tributaristas precisaram exercer o quanto antes, simulando e fazendo projeções, confrontando “os prós e contras” de se manter na opção pelo sistema atual ou migrar para o regime regular do IBS e da CBS, o que trará desafios, desafios significativos com a Reforma Tributária, mas também terão oportunidades para se tornarem mais competitivas. Alguns dos principais desafios incluem:

  • Adaptação à Nova Tributação: As empresas precisarão se adaptar ao novo sistema de IVA, o que pode exigir investimentos em tecnologia e capacitação.
  • Revisão de Contratos: A mudança na tributação pode exigir a renegociação de contratos com fornecedores e clientes, para garantir que os custos sejam repassados de forma equilibrada.
  • Impacto na Competitividade: Empresas que não conseguirem ajustar seus preços de forma eficiente podem perder competitividade no mercado.

Por outro lado, as oportunidades incluem:

  • Redução da Burocracia: A simplificação do sistema tributário pode reduzir a burocracia e os custos com compliance, beneficiando as micro e pequenas empresas, o que não quer dizer que seria tão simples como se percebe ou se busca perceber com o próprio regime!
  • Acesso a Créditos Tributários: A adoção do IVA pode permitir que as empresas do Simples Nacional acessem créditos tributários, reduzindo a carga fiscal e melhorando a rentabilidade.

Oportuno deixar algumas breves, mas importantes recomendações para as Empresas do Simples Nacional

Para se adaptar às mudanças trazidas pela Reforma Tributária, as empresas optantes do Simples Nacional devem:

  1. Realizar uma Análise de Impacto: Avaliar como a nova tributação afetará seus custos e preços, identificando oportunidades de ajuste.
  2. Investir em Tecnologia: Utilizar ferramentas de gestão tributária e financeira para monitorar e ajustar os preços de forma dinâmica.
  3. Capacitar a Equipe: Treinar os colaboradores para entender as novas regras e procedimentos tributários.
  4. Revisar Contratos: Renegociar contratos com fornecedores e clientes para garantir que os custos sejam repassados de forma equilibrada.
Mudança na Estratégia de Precificação e Margem de Lucro

A implementação do Imposto sobre Valor Agregado (IVA) no modelo brasileiro, por meio do IBS e da CBS, impõe uma ruptura com a lógica atual de formação de preços e composição de margens. Sob o regime atual, tributos como ICMS, ISS, PIS e COFINS muitas vezes se confundem com os custos operacionais, devido à sua incidência em cascata, cumulatividade parcial e estrutura por dentro. Isso leva muitos empresários a adotarem margens de lucro “infladas”, que absorvem riscos tributários e compensam a insegurança jurídica.

No sistema tributário atual, a margem de lucro “inflada” é marcada por: tributos cumulativos ou parcialmente não recuperáveis (como PIS/COFINS em regime cumulativo); tributação por dentro (em que o imposto integra a própria base de cálculo, como o ICMS); complexidade e insegurança jurídica, que geram risco de autuação fiscal; os empresários, muitas vezes, não conseguem identificar com precisão o custo efetivo dos tributos incidentes em cada etapa da cadeia.

Diante dessa incerteza, muitos preferem “jogar para cima” o preço de venda ou ampliar a margem de lucro como forma de compensar possíveis custos ocultos, contingências tributárias, ou mesmo perda de créditos, ou seja, inflacionam artificialmente a margem, como estratégia de proteção contra o sistema tributário ineficiente.

Em mercados mais concentrados ou com produtos de menor sensibilidade ao preço (demanda inelástica), esse comportamento acaba sendo viável. Já em mercados competitivos, isso prejudica a competitividade e pode reduzir o volume de vendas.

Com a simplificação tributária e a possibilidade de crédito amplo, empresas precisarão revisar sua margem para garantir competitividade. O repasse de tributos ao consumidor final poderá ser ajustado, considerando a nova composição de custos e a elasticidade da demanda para determinados bens e serviços. Bens e serviços com demanda inelástica, como energia, saúde e educação, terão maior facilidade em repassar aumentos de custos aos consumidores. Já setores com demanda mais elástica, como turismo, entretenimento e consultorias, poderão enfrentar resistência dos consumidores a aumentos de preços, o que pode pressionar as margens de lucro e demandar ajustes estratégicos na precificação. Esse fenômeno reforça a necessidade de uma análise setorial detalhada para evitar impactos negativos sobre a economia.

Além disso, a precificação dinâmica, estratégia que já é uma tendência em setores como o varejo e o turismo, ganhará ainda mais relevância com a reforma. Empresas poderão ajustar preços em tempo real, considerando a carga tributária efetiva e a demanda do mercado. Essa flexibilidade será essencial para manter a competitividade em um ambiente de negócios cada vez mais digitalizado e globalizado.

Essa estratégia ganhará destaque com a Reforma Tributária, dado sua abordagem que consiste em ajustar os preços de produtos ou serviços em tempo real, com base em fatores como demanda, concorrência, custos operacionais e até mesmo o comportamento do consumidor. Diferente da precificação tradicional, onde os preços são fixos ou alterados apenas periodicamente, a precificação dinâmica permite que as empresas respondam rapidamente às mudanças do mercado, maximizando receitas e otimizando a competitividade.

No contexto da Reforma Tributária sobre o consumo, é crucial reafirmar que os tributos não devem intervir nas relações negociais privadas. A formação dos preços deve refletir essencialmente variáveis mercadológicas, tais como nível de demanda, concorrência, custos operacionais, percepção de valor e comportamento do consumidor. Quando o sistema tributário se sobrepõe a essas variáveis, distorcendo margens de lucro ou induzindo práticas artificiais de precificação, o resultado é um desequilíbrio que compromete a eficiência alocativa da economia.

A proposta de adoção de um IVA moderno visa justamente mitigar essas interferências. Ao centralizar a tributação no consumo, com créditos financeiros amplos e um modelo por fora, o novo sistema busca garantir que as decisões empresariais, inclusive a estratégia de precificação, sejam tomadas com base em fundamentos econômicos, e não fiscais.

A autonomia da formação de preços também resguarda o princípio da livre iniciativa, previsto no art. 170 da Constituição Federal, impedindo que o tributo se torne uma variável estratégica nas relações comerciais. Trata-se, portanto, de uma perspectiva que confere maior justiça, previsibilidade e racionalidade ao ambiente de negócios, fortalecendo a competitividade e a eficiência do mercado.

A cobrança do imposto no local de destino e a nova precificação

A adoção da cobrança do imposto no local de destino, tal como previsto na reforma tributária brasileira, representa uma mudança estrutural na lógica de arrecadação e tem reflexos profundos sobre a precificação e a lucratividade das empresas. Diferentemente do modelo atual, em que o imposto sobre o consumo é, em boa parte, recolhido na origem, ou seja, no local de produção ou prestação do serviço, o novo paradigma transfere o protagonismo arrecadatório para o local onde se dá o efetivo consumo da mercadoria ou serviço.

Essa alteração afeta diretamente a estrutura de custos e o planejamento logístico das empresas, sobretudo aquelas com atuação nacional e presença em múltiplos estados. Com o fim da guerra fiscal e a padronização das regras de apuração, os incentivos baseados em localização geográfica perdem força, o que exige das empresas uma nova lógica para alocação de centros de distribuição, plantas industriais e estratégias de venda.

Além destes aspectos, vistos até aqui, a tributação no destino impactará diretamente a competitividade entre estados e municípios, representando uma mudança estrutural na economia brasileira, reduzindo a guerra fiscal e promovendo um ambiente de negócios mais equilibrado, ao menos é o que se idealiza com a reforma tributária. No entanto, essa mudança pode aumentar a complexidade para empresas que operam em múltiplas localidades, exigindo ajustes logísticos e novas estratégias de precificação, onde a escolha pelos fornecedores passa a exercer um papel central e determinante.

Na perspectiva do processo de definição do valor monetário a ser cobrado do cliente por um produto, mercadoria ou serviço, conhecido como precificação, o imposto incidente no destino poderá alterar a formação do preço final, uma vez que, a depender da alíquota adotada pelo estado destinatário, o valor do tributo a ser destacado (por fora) pode variar, mesmo com o preço líquido sendo o mesmo. Tal fato exige maior atenção na definição das margens de lucro regionais, pois o mesmo produto pode ter rentabilidade diferente conforme o local de consumo.

Assim, embora a lógica de destino promova justiça fiscal entre os entes federados, seus efeitos sobre a margem e a precificação impõem uma reconfiguração profunda, exigindo ajustes significativos nos sistemas de precificação, demandando uma mensuração precisa do lucro líquido por unidade federativa. Essa abordagem detalhada é essencial para aprimorar o controle gerencial, assegurar a conformidade fiscal e fundamentar decisões estratégicas de expansão territorial.

As empresas que conseguirem se adaptar rapidamente às novas regras terão uma vantagem competitiva significativa, enquanto aquelas que não se prepararem adequadamente poderão enfrentar custos adicionais e perda de eficiência.

Equidade e Justiça fiscal: influência direta na formação dos preços

A Reforma Tributária foi apresentada como uma solução para simplificar o sistema, eliminar privilégios e tornar a tributação mais justa. De fato, a unificação dos tributos e a redução da cumulatividade favorecem a economia formal e aumentam a transparência fiscal. Além disso, a reforma prevê mecanismos para aliviar o impacto sobre a população de baixa renda, como alíquotas reduzidas para bens essenciais e o sistema de cashback.

Contudo, a equidade fiscal não significa que todos os setores serão afetados da mesma forma. Como já observado, o setor de serviços, por exemplo, pode enfrentar uma tributação maior devido à mudança no modelo de cálculo, enquanto indústrias que antes sofriam com a cumulatividade podem se beneficiar. O desafio será equilibrar esses efeitos e garantir que a reforma cumpra sua promessa de justiça tributária, sem penalizar setores essenciais para a economia e a geração de empregos, o que carece de um exercício amplo para não se perceber que o desequilíbrio já está instaurado, a ver quando todo o ecossistema se amoldar a reforma, após anos de maturação.

A inclusão deste tópico para tratar a “Equidade e Justiça Fiscal” pode parecer, à primeira vista, distante do foco central do artigo, que é a análise dos impactos na precificação. No entanto, sua presença é justificada pela importância de entender que a forma como os tributos são aplicados e distribuídos influencia diretamente a formação dos preços. Em outras palavras, a busca por equidade e justiça fiscal não é apenas uma questão normativa ou de distribuição de renda, mas também um elemento que afeta as estratégias de precificação e, consequentemente, as margens de lucro das empresas.

Ao adotar um sistema mais justo e transparente, a reforma procura minimizar distorções que podem, por exemplo, levar a estratégias de precificação inflacionadas ou a repasses ineficientes dos custos tributários aos consumidores. Assim, a discussão sobre equidade fiscal fornece a base teórica que sustenta a necessidade de um sistema tributário que não interfira indevidamente na dinâmica de mercado, contribuindo para a formação de preços mais competitivos e que reflitam o verdadeiro custo dos produtos e serviços.

Portanto, este tópico é fundamental para contextualizar os impactos na precificação, demonstrando que uma reforma tributária que respeite os princípios da justiça e da neutralidade pode, de fato, contribuir para um ambiente de negócios mais eficiente e equilibrado.

Impactos das Alíquotas Diferenciadas

Sendo breve, a possibilidade de alíquotas diferenciadas para determinados setores, como educação, saúde e transporte público, visa minimizar o impacto sobre serviços essenciais, ok! Entretanto, esse modelo pode gerar desafios na precificação, pois cria distorções na concorrência entre empresas de diferentes segmentos e na alocação de recursos na economia. Além disso, tal prática se exercida de forma exacerbada, ou melhor, sem critérios, pode gerar disputas jurídicas, o que foge do propósito deste artigo.

Não poderia deixar de chamar a atenção para esse fato notório, afinal as exceções na tributação, mesmo que justificáveis, tendem a prejudicar a simplicidade e a imparcialidade do sistema ideal, podendo resultar em consequências opostas às desejadas, afinal tal fragmentação pode resultar em preços desiguais, sua existência gera uma disfunção sistêmica, pois compromete o princípio da neutralidade tributária. 

Em outras palavras, mesmo sendo originária de uma construção política, imposta legalmente por lei complementar, a diferenciação nas alíquotas distorce a formação de preços ao forçar empresas a ajustarem suas margens de lucro de forma desigual entre os setores. Essa disfunção pode impactar a competitividade, pois setores sujeitos a alíquotas mais elevadas poderão ver seus preços inflacionados, enquanto outros terão uma base de custos mais favorável, criando um desequilíbrio competitivo que afeta tanto a eficiência econômica quanto a equidade no mercado.

A prova disso é que a primeira iniciativa caso a alíquota referencial não suficiente para se manter a carga tributária, serão essas alíquotas que serão revistas! Mas, falar de impactos do preço e não lançar um olhar sob essa perspectiva, penso que deixaria uma lacuna a ser preenchida, muito embora ratifico a pretensão de não esgotar o assunto.

Split Payment como Ferramenta de Controle e Gestão dos Tributos e seu Engajamento na Precificação

O Split Payment (Pagamento Dividido) surge como uma ferramenta inovadora para aprimorar a transparência e o controle tributário na precificação de bens e serviços. Esse mecanismo separa o valor do tributo do preço do produto ou serviço no momento da transação, permitindo que o consumidor visualize claramente quanto está pagando pelo item e quanto corresponde ao imposto.

Benefícios do Split Payment para Empresas e Consumidores
  • Transparência Fiscal Ampliada: O Split Payment corrobora para eliminar a opacidade dos tributos indiretos, que hoje são embutidos nos preços. Isso alinha-se à proposta da Reforma Tributária de tornar a carga tributária mais clara, fortalecendo a confiança do consumidor.
  • Redução de Riscos de Sonegação: Ao separar o tributo no momento do pagamento, o mecanismo facilita a fiscalização e reduz a possibilidade de divergências entre o valor declarado e o efetivamente recolhido.
Desafios na Implementação
  • Adaptação Tecnológica: A adoção do Split Payment exige atualizações em sistemas de gestão, emissão de notas fiscais e integração com órgãos fiscais, o que pode representar custos iniciais para micro e pequenas empresas.
  • Impacto na Competitividade: Setores com margens apertadas podem enfrentar dificuldades para manter preços atrativos, já que a separação do tributo expõe custos antes ocultos.
Integração com a Reforma Tributária

O Split Payment complementa a proposta do IVA ao reforçar a transparência na tributação “por fora”. Ao conscientizar o consumidor sobre o impacto tributário de suas escolhas, a segregação de tributos no pagamento é uma medida necessária para garantir imparcialidade e justiça fiscal.

Além disso, o mecanismo pode mitigar distorções causadas pela cumulatividade, já que o tributo é recolhido em cada etapa da cadeia, sem sobreposições. Para empresas do Simples Nacional, porém, a adaptação exigirá atenção, pois a migração para o IVA já demandará revisão de processos contábeis-fiscais.

Conclusão

A Reforma Tributária sobre o consumo representa um marco na estrutura fiscal do Brasil, prometendo maior simplicidade e transparência, mas também trazendo desafios significativos para a precificação de bens e serviços. A substituição do modelo atual pelo IVA dual (IBS e CBS) eliminará a cumulatividade e reduzirá distorções, promovendo um sistema mais alinhado aos princípios constitucionais de isonomia e capacidade contributiva. No entanto, a redistribuição da carga tributária entre os setores evidencia que a neutralidade absoluta não será alcançada, especialmente para segmentos que hoje se beneficiam de regimes com uma certa, digamos cordialidade, especialmente em se tratando de uma carga tributária aprazível.

A precificação será profundamente impactada, exigindo novas estratégias empresariais para lidar com a tributação por fora e no destino, assim como o compliance fiscal, tendo em vista a sistemática de créditos a atender o princípio da não cumulatividade. A tributação no destino pode trazer eficiência na arrecadação, mas também exigirá ajustes logísticos e negociações comerciais mais complexas. A substituição de tributos cumulativos, na máxima de que atualmente o que se tem é uma “não cumulatividade parcial”, já que é notório e sabido que resíduos de créditos tributários não são aproveitados ao longo da cadeia produtiva. A ideia com a implementação da CBS e do IBS em um modelo de IVA, é que ao eliminar a cascata de tributos, o custo dos produtos diminua, gerando alívio para o consumidor final. 

A reforma não apenas torna o sistema mais simples e eficiente, mas exige uma profunda reestruturação na forma como empresas operam e formam seus preços. Sua implementação deve ser acompanhada com cautela, buscando garantir que os princípios constitucionais que a sustentam sejam, de fato, respeitados, para que o Brasil tenha um sistema tributário mais justo e eficiente.

O artigo constrói um racional interessante, no qual a reforma tributária não foi idealizada apenas para CNPJ’s, mas seu sucesso em beneficiar CPF’s depende de um ecossistema de políticas complementares e de uma implementação técnica impecável. A simplificação é um meio, não um fim: o verdadeiro objetivo é um sistema mais justo e eficiente, que, no longo prazo, beneficie toda a economia. 

Por fim, passamos pela implementação do Split Payment na reforma tributária sobre o consumo no Brasil, o que representa um desafio, mas também uma oportunidade para as empresas modernizarem suas práticas de gestão tributária. Preparar-se adequadamente para essas mudanças é fundamental para garantir a conformidade e a sustentabilidade financeira no novo cenário tributário, o que pode resultar em preço justo do negócio. Entretanto, essa mudança exige que as empresas revisem suas práticas internas para preservar a liquidez e assegurar que a precificação reflita o custo real dos produtos, sem distorções. As empresas que adotarem uma abordagem proativa estarão melhor posicionadas para enfrentar os desafios e aproveitar as oportunidades que surgirem com a reforma.


Márcio Robson Costa é Mestre em Ciências Contábeis pela Fucape Business School, Contador — Ex Conselheiro e Vice-Presidente de Turma no CARF — Consultor Tributário. Especialista em Direito e Planejamento Tributário, dentre outras disciplinas que cursou em Pós-Graduação/MBA: Gestão Estratégica de Empresas, Finanças e Gestão Coorporativa e Controladoria e Auditoria. Professor convidado na Pós-Graduação na Mackenzie/RJ. Professor do CRC-RJ. Membro da Comissão de Assuntos Tributários do CRC-RJ e Ex Pesquisador do Grupo de Tributação do Consumo do Núcleo de Pesquisas do Mestrado (NUPEM) – IBDT (Instituto Brasileiro de Direito Tributário).


Os artigos escritos pelos “colunistas” não refletem necessariamente a opinião do Portal da Reforma Tributária. Os textos visam promover o debate sobre temas relevantes para o país.

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