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A nova obrigação de coleta do CPF/CNPJ de clientes

Reprodução: Freepik.

Por Luiz Roberto Peroba

Este artigo tem como objetivo analisar as regras que impõem aos fornecedores de bens e serviços a obrigação de coletar e informar o CPF ou CNPJ de seus clientes para fins de reportar suas operações nos documentos fiscais. Essa exigência encontra fundamento nos artigos 59 e 11 da LC nº 214/25, que estabelecem diretrizes para a identificação de pessoas físicas e jurídicas por meio do cadastro de identificação única, além de disciplinarem a determinação do local de ocorrência das operações, elementos essenciais para a correta aplicação das normas tributárias.

O artigo 59 determina que todas as pessoas físicas e jurídicas, inclusive as entidades sem personalidade jurídica, sujeitas ao IBS e à CBS, se inscrevam no cadastro com identificação única administrados pela Receita Federal, que deverá considerar para (i) pessoas físicas, o Cadastro de Pessoas Físicas (CPF); (ii) pessoas jurídicas e entidades sem personalidade jurídica, o Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ); e (iii) no caso de operações imobiliárias, a identificação do bem será feita por meio do Cadastro Imobiliário Brasileiro (CIB).

O artigo 11, por sua vez, define o local da operação para fins de destinação da arrecadação dos novos tributos. De acordo com esse dispositivo, considera-se o domicílio principal do adquirente ou do destinatário o local constante do cadastro com identificação única. Esse dispositivo também leva à interpretação de que as empresas fornecedoras de bens ou serviços deverão possuir o CPF ou CNPJ dos adquirentes a fim de que possam indicar corretamente o local de destino por meio do documento fiscal a ser emitido para acobertar a operação.

Ainda de acordo com o artigo 11, caso o adquirente ou destinatário não esteja regularmente cadastrado, o fornecedor dos bens ou serviços deve eleger dois dos seguintes critérios que não sejam conflitantes: (i) endereço declarado ao fornecedor; (ii) endereço obtido mediante coleta de outras informações comercialmente relevantes no curso da execução da operação; (iii) endereço do adquirente constante do cadastro do arranjo de pagamento utilizado para o pagamento da operação; e (iv) endereço de IP do dispositivo utilizado para contratação da operação ou obtido por emprego de método de geolocalização. Caso não seja possível cumprir esses requisitos, deverá ser considerado o endereço declarado ao fornecedor.

A consequência das regras contidas nesses dispositivos é que o fornecedor deverá obter o CPF ou CNPJ do seu adquirente a fim de completar suas transações e reportar ao fisco as operações realizadas com a emissão dos documentos fiscais e, apenas na hipótese de adquirente não cadastrado regularmente, é que valerão as regras subsidiárias indicadas acima para determinação do local da ocorrência da operação a permitir a correta destinação do IBS. 

Dessa forma, verifica-se que a falta de identificação do adquirente pode gerar dificuldades operacionais significativas para o fornecedor, podendo até mesmo impedir a conclusão da transação. Isso porque, no sistema de notas pré-preenchidas que se pretende implementar, a indicação do CPF ou CNPJ já permitiria que o sistema completasse os dados do documento fiscal para sua emissão. Entretanto, sem esses dados, é provável que o documento sequer possa ser emitido.

O descumprimento dessa obrigação pode, inclusive, sujeitar o fornecedor à imposição de penalidades pelo fisco. O PLP 108/24 prevê, dentre as hipóteses de descumprimento de obrigações acessórias, a aplicação de penalidades para casos em que um bem seja fornecido ou um serviço seja prestado desacobertado de documento fiscal. Para essa conduta, o texto do projeto de lei estabelece uma multa correspondente a 30% do valor da operação.

Além disso, mesmo que o fornecedor emita o documento fiscal, a ausência dos dados do adquirente pode resultar na aplicação de outra penalidade, decorrente da emissão de documento fiscal em desacordo com os requisitos legais ou com informações insuficientes ou incorretas, que pode chegar a 40% do valor do IBS devido na operação. Assim, é possível que, na falta de indicação do CNPJ ou CPF do adquirente, ou indicação inexata, o fornecedor seja penalizado nos termos dessa disposição legal.

Da forma como a regra está prevista atualmente, portanto, o fornecedor pode ficar impossibilitado de realizar a venda de bens e a prestação de serviços, o que representa uma violação ao princípio do livre exercício da atividade econômica. Além disso, mesmo que aja de boa-fé e emita o documento fiscal correspondente, ele ainda estaria sujeito à aplicação de penalidades por descumprimento de obrigações acessórias, gerando insegurança jurídica e impactos financeiros que podem comprometer suas operações.

Diante da regra estabelecida pela LC nº 214/25 e da ausência de regulamentação, que ainda será editada, é essencial que as empresas adotem as medidas necessárias para obter o CPF e o CNPJ de seus clientes, na implementação da reforma. Caso contrário, poderão enfrentar impedimentos na emissão de documentos fiscais para acobertar suas operações, além de estarem sujeitas a penalidades que podem impactar significativamente suas finanças.


Luiz Roberto Peroba é Sócio/Tax Partner no Pinheiro Neto. Assessora clientes nacionais e estrangeiros de diversas indústrias, tanto em consultoria/planejamento tributário como contencioso, em disputas administrativas e judiciais.


Os artigos escritos pelos “colunistas” não refletem necessariamente a opinião do Portal da Reforma Tributária. Os textos visam promover o debate sobre temas relevantes para o país.

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